Palavras-chave: neurociência, emoção, sentimento, evolução, ódio, raiva, agressividade
Resumo.
Sentimentos e emoções serviram a nossa sobrevivência como espécies no planeta pois,
como exemplo, o amor, o afeto e o carinho entre pais e filhotes foram e
são uma ligação das mais importantes do reino animal, até os pequenos
animais adquirirem maturidade para uma vida independente. Mas, e os
sentimentos e as emoções negativas? Como estamos vivos hoje se antes da
nossa espécie já havia ancestrais com poderosíssimas forças negativas em
suas mentes? O que aconteceu e o que acontece? Estariam e estão na
contramão da evolução? Neste artigo eu discorro sobre dois deles,
aparentemente desastrosos para quaisquer espécies, e dos mais comuns e
intensos, o ódio e a raiva, e mais ainda, com o potencial de levar à
agressividade, mas possuindo sim um papel indispensável na evolução se
analisados cuidadosamente. A partir do desenvolvimento do sistema
nervoso, do mais primitivo ao mais capacitado e complexo, o cérebro
humano, mostro como foram fundamentais na preservação das espécies de
muitos seres vivos.
Introdução.
Nos
meus artigos “A base material dos sentimentos”, (1) “A base material
dos sentimentos - II” (2), “O porquê dos nossos sentimentos” (3) e “O
porquê dos nossos sentimentos - II” (4), também presentes em “Sistemas,
teoria da evolução e neurociências”, (5) eu escrevi sobre os
sentimentos positivos como imprescindíveis na perpetuação dos seres
humanos na Terra e reconheço a necessidade de se escrever sobre os sentimentos negativos porque
também são reais, existem conosco e outros animais desde há muito
tempo, e, aparentemente em uma grande contradição, tiveram suas
importâncias na evolução.
Agressividade
Para começar voltarei no tempo justamente na época do próprio surgimento e desenvolvimento ulterior da vida.
Imagine
um cenário muito antigo, em um lago ou oceano, quando dos primeiros
seres vivos unicelulares, com uma substância, uma fonte de calor, etc.,
ameaçando um grupo desses pequenos seres já providos de movimentos
próprios. Alguns deles não só conseguiam perceber o perigo como também
reagiam se movendo em direção e sentido opostos ao local dessas ameaças.
Os outros simplesmente seriam destruídos por esses fenômenos tão comuns
na natureza.
Percebe-se
por aqueles sobreviventes, dois fatores cruciais em suas reações: a
percepção da ameaça e todo um sistema a colocar-lhes em movimento a um local seguro. O
movimento desses heróis microscópicos reflete uma pequena dose de
agressividade perante ao meio ambiente, uma não passividade frente ao
perigo, um pequeno, mas verdadeiro embrião de um sistema nervoso a
serviço de suas sobrevivências.
Na
alimentação por fagocitose, os pseudópodes da célula agressora englobam
o material a ser ingerido. É um processo ativo, demonstrando de forma
mais clara esse embrião de sistema nervoso pois há intenção, ataque e
captura de uma “presa”, a saber, um simples corpo sólido ou outro ser
vivo, mas indispensável à vida de quem o realiza. Imagine então um
predador, um organismo multicelular, no qual a sua presa percebe a sua presença e tende a se afastar ou a se defender.
Um
processo desses preservado, aperfeiçoado, por genes, chegou até nós e o
fazemos com requintes de crueldade para saborearmos uma boa porção de
carne. Veja, bilhões de anos, inúmeras quantidades de predadores,
presas, habitats e comportamentos inexistentes hoje ou não, levam a
marca implacável da agressividade como denominador comum na
sobrevivência das espécies.
Mas
a agressividade se revela de maneira diversa em seres vivos complexos
não só com respeito à captura de presas, em ataques dos mais variados
modos, etc. Dizendo do comportamento humano, você, ao colocar toda a sua
motivação para terminar um trabalho atrasado, podendo até lhe causar a
perda do emprego, estará descarregando uma grande dose de agressividade.
Uma repreensão verbal a um filho de forma enérgica pois ele acabara de
fazer algo errado também é uma agressão, embora diferente pois é de
maneira consciente, respeitosa, ensinando-o diferenciar o certo do
errado.
E
a agressividade entre pessoas levando à morte ou a danos físicos? Isso
sempre existiu e realmente, em sua maioria, é contra a evolução. Mas, simplificando, todas
as pessoas não ficam todos os dias se agredindo! Aqui, neste ponto do
artigo, deve-se ter cuidado com ideias e colocações pois realmente o ser
humano sempre viveu em conflitos e guerras, mas hoje somos mais de sete
bilhões habitando a Terra. Outros valores e sentimentos predominaram.
Raiva
Uma emoção poderosa, causada por muitos fatores como não atingirmos um objetivo ou necessidade, termos uma contrariedade, não satisfazer um desejo ou termos uma ação frustrada, sentirmos nossos direitos desrespeitados, nos depararmos com injustiças, críticas, ofensas,
etc. Nosso dia a dia também acarreta estados de raiva: uma fila
demorada, uma piada de mau gosto, um aceno indesejado de alguém no
trânsito, etc.
Apesar
de ser uma emoção destrutiva eu pergunto: quem gostaria de passar raiva
durante 24 horas? Temos defesas para afastarmos estados de raiva,
principalmente a racionalização, a qual, em nossa razão, pode-se
determinar se compensa ou não uma ação guiada pela raiva. Mas, como a agressividade, ela existe…
A mesma questão como na agressividade: ela estaria na contramão da evolução? A resposta também é não. Ela aumenta a energia e a força para um animal abater uma presa reagindo
com eficiência a um ataque. Um complemento, uma ajuda na agressividade.
E como na repreensão verbal a um filho citado em “agressividade”, você
poderá estar com raiva dele, mas a canaliza para o bem-estar da criança.
Se no modo de vida moderno nós não precisamos abater diretamente um animal como faziam os antigos caçadores coletores, temos muitos estímulos levando-nos à raiva, mas aprendemos a, pelo menos, não a deixar alterar de modo significativo o nosso bem-estar psicológico e dos outros. Uma luta diária. Extravasamos nossa raiva falando de nossos sentimentos...
Ódio
De um rancor duradouro até um profundo sentimento de repulsa por alguém, o ódio também parece se localizar na contramão da evolução. Então por que o temos?
Exemplos de nossos ancestrais em suas vidas primitivas permitem
termos uma boa pista para esse aparente paradoxo. Um predador passa
próximo a um grupo de humanos e se afasta. Não atacou ninguém, mas todos
desconfiam de sua volta. E quando aparece desperta ódio, talvez já
presente em muitos da tribo, levando aquelas pessoas a um ataque
possivelmente já combinado entre os mais destemidos do grupo.
O
ódio a um inimigo ou a quem represente uma ameaça, poderá deixar uma
mãe prestando mais atenção em possíveis perturbações a seus filhotes, ou
seja, ele proporcionaria uma série de comportamentos não existindo sem
ele na defesa da prole e de si mesma. Um ótimo exemplo de situações como
essas é o próprio aprendizado da mãe nesse exemplo.
Gosto
de raciocinar de uma forma, sendo “o pensar ao contrário”: se o ódio, a
raiva e a agressão não existissem, quanto não ficaríamos vulneráveis
sem eles? Seria possível um ser vivo tão complexo como nós, mas tão
puro, ingênuo e passivo?
Acreditar só no amor ou somente nos sentimentos positivos existindo em animais complexos, com comportamentos complexos, me parece uma grande ingenuidade. O amor tem como oposto a indiferença, mas e o não gostar de algo? Me parece fazer parte da nossa sobrevivência o não gostar de muita coisa chegando realmente ao ódio àquilo perigoso a nós, comuns em quaisquer habitats onde vivemos.
No plano social o ódio pode aparece entre pessoas que
não se gostam ou é o resultado de desavenças, mas, como a raiva, há um
certo controle por parte do ser humano para muitas diferenças não os levarem
a conflitos desastrosos. Aprendemos a nos controlar, racionalizar como
na raiva, percebendo se compensa ou não uma discussão ou uma agressão
devido a um sentimento profundo como esse.
Os seres vivos sempre estiveram em um mundo repleto de estímulos positivos e negativos!
Do primeiro exemplo neste texto sobre um unicelular fugindo de uma
fonte de calor, denotando uma reação a um estímulo negativo, até uma mãe
não gostando nada de um inimigo ou uma ameaça
a sua prole, algum animal considerado perigosa para ela, a
agressividade, acompanhada por raiva, ódio, etc., se perpetuaram como
comportamentos de geração a geração. Não dá para conceber um planeta
como o nosso onde sobreviveriam apenas indivíduos com reações benéficas
com o ambiente. E note no exemplo da mãe a necessidade de um sistema nervoso complexo, evoluído de muitas e muitas gerações como são os dos mamíferos.
Seja
lá como eram os primeiros unicelulares em estrutura e comportamento,
eles estavam adaptados e procriaram dentro de ambientes com estímulos
positivos e negativos reagindo de forma adequada a cada um deles.
Conforme o sistema nervoso foi evoluindo, regiões e/ou funções diversas
responsáveis pela agressão, raiva e o ódio, foram se perpetuando nos
organismos multicelulares.
Bibliografia:
1 - Argos (de) Arruda Pinto. A base material dos sentimentos. Cérebro & Mente. 2001. Disponível em: < http://www.cerebromente.org.br/n12/opiniao/sentimentos.html >. Acesso em: 11/07/2018.
2 - Argos (de) Arruda Pinto. A base material dos sentimentos - 02. Cérebro & Mente. 2001. Disponível em: < http://www.cerebromente.org.br/n13/opiniao/material.html >. Acesso em: 11/07/2018.
3 - Argos (de) Arruda Pinto. O Porquê dos nossos sentimentos. Cérebro & Mente. 2001. Disponível em: < http://www.cerebromente.org.br/n14/opinion/material3.html >. Acesso em: 11/07/2018.
4 - Argos (de) Arruda Pinto. O Porquê dos nossos Sentimentos - 02. Cérebro & Mente. 2002. Disponível em: < http://www.cerebromente.org.br/n15/opiniao/sentimentos2.html >. Acesso em: 11/07/2018.